Impactos da reforma tributária na natureza jurídica da Nota Fiscal Eletrônica

A jurisprudência do Superior Tribunal de Justiça (STJ) consolidou o entendimento de que a simples emissão de documento fiscal não constitui crédito tributário, exigindo um ato formal de lançamento ou confissão do débito pelo contribuinte. No entanto, a Lei Complementar nº 214/2025 alterou essa lógica ao determinar que a emissão da nota fiscal eletrônica, para fins de IBS e CBS, passa a ser um ato declaratório e confessional do tributo devido. Essa mudança representa uma transformação na função da nota fiscal, que deixa de ser apenas um instrumento de controle fiscal e passa a gerar automaticamente a constituição do crédito tributário.

Essa nova regulamentação contraria entendimentos anteriores do STJ, que já havia afastado a equiparação entre emissão de nota fiscal e declaração do contribuinte, reafirmando a necessidade de um lançamento formal para a constituição do crédito tributário. A medida também pode gerar insegurança jurídica, pois qualquer erro na emissão do documento poderá resultar na exigência automática de tributos, sem a necessidade de um ato administrativo prévio de apuração. Além disso, há impactos diretos sobre o contraditório e a ampla defesa, já que a confissão do débito pode restringir a possibilidade de contestação administrativa ou judicial.

Entre os efeitos práticos da mudança, destaca-se a antecipação do prazo para a cobrança judicial dos tributos, que passa a contar a partir da emissão da nota fiscal, e não mais da entrega de declaração específica pelo contribuinte. Isso pode aumentar o número de execuções fiscais e elevar os riscos de cobranças indevidas. Diante desse cenário, a validade da nova norma deverá ser analisada pelo STJ e pelo Supremo Tribunal Federal (STF), especialmente quanto à sua compatibilidade com o Código Tributário Nacional e princípios constitucionais, como o devido processo legal e o direito à ampla defesa.

Fonte: Conjur